Em meio às crescentes cobranças dos agentes econômicos, o governo federal começa a dar sinais mais frequentes de que buscará aprofundar o revisão de despesas medidas orçamentárias − para complementar a agenda de recomposição da base tributária − na busca do equilíbrio nas contas públicas. O movimento ocorre após o Congresso Nacional devolver ao Poder Executivo parte relevante da medida provisória (MPV 1.227/2024) com ações para compensar isenções a 17 setores econômicos e diversos municípios.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que na noite deste sábado (15) retornou a Brasília de agenda oficial na Europa, realizará, nesta segunda-feira (17), a partir das 10h30, reunião com os ministros que fazem compõem a Diretoria de Execução Orçamentária (JEO): Fernando Haddad (Tesoura), Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), Rui Costa (Casa Civil) e Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos).
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A reunião entre o presidente e os membros do conselho orçamental representa o primeiro grande teste político para possíveis cortes de despesas. Nos últimos dias, o próprio Lula admitiu a possibilidade de rever algumas despesas, desde que o reajuste não penalize as camadas mais pobres da população. “Tudo o que detectamos como despesa desnecessária, não temos que fazer”, disse durante a viagem internacional.
A postura representa uma mudança em relação às declarações que focavam na busca de novas fontes de receitas para enfrentar o aumento das despesas. Mas os efeitos ainda precisam de ser verificados na prática, quando ações impopulares podem ser postas em cima da mesa pela equipa económica. Em discursos anteriores, que fizeram o dólar disparar frente ao real, Lula havia insistido na fórmula do equilíbrio fiscal por meio do aumento da arrecadação e da queda da taxa básica de juros da economia, a Selic, hoje em 10,5% ao ano.
No setor produtivo, a medida provisória que limitava a utilização de créditos do PIS (Programa de Integração Social) e da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) para a redução de outros tributos e proibia o reembolso em dinheiro do crédito presumido era vista como a “última gota”.
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Desde então, o empresariado intensificou o seu discurso sobre o esgotamento da agenda de ajustamento do ponto de vista das receitas – avaliação que também ecoou os recentes discursos da ministra Simone Tebet, que reconheceu que agora é o momento de intensificar os cortes nas despesas. Segundo ela, existe todo um alfabeto de opções que podem ser adotadas pelo governo. Muitas iniciativas, porém, enfrentam resistência até mesmo na base da atual gestão, especialmente no Partido dos Trabalhadores (PT) e outras siglas de esquerda.
“O sinal amarelo já está aceso e, pelo menos no discurso, o governo diz que entende”, aponta o cientista político Leonardo Barreto, CEO da consultoria I3P Risco Político. Para ele, o encontro de Lula com o JEO é “um dos acontecimentos políticos mais decisivos do semestre”, diante das expectativas de apoio a uma agenda de controle de gastos.
Na avaliação do especialista, o encontro visa, no curto prazo, influenciar a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central desta semana, que deve marcar uma interrupção no ciclo de corte dos juros, em meio ao aumento das perspectivas de inflação e a valorização da taxa de câmbio, além das incertezas fiscais e internacionais.
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No médio prazo, diz Barreto, o encontro no Palácio do Planalto visa “dar um choque de confiança na economia”. “Este tipo de compromisso fiscal já foi feito antes (anúncio de metas fiscais ambiciosas) e não se sustentou na prática. Será diferente desta vez?”, questiona.
“O governo precisa fortemente dessa agenda para dar um choque de confiança. Mas isso só acontecerá com o anúncio de um plano factível e com o apoio explícito de Lula e do PT, sob pena de não inspirar os parceiros do governo na coalizão do Congresso Nacional. Para Lula, nada mais importante do que tentar chocar a confiança na economia, e isso só virá com garantias concretas de que o país não repetirá o biênio 2015/16”, finaliza.
O movimento, porém, não é nada trivial, considerando o tom impopular das iniciativas, o calendário apertado no Congresso Nacional, as dificuldades do governo em construir uma base sólida de apoio no Poder Legislativo e a proximidade das eleições municipais. Interlocutores do Governo avaliam que estas serão eleições “muito difíceis” e que o caminho a seguir seria “fazer todo o possível agora”, dar algum tipo de sinal aos agentes financeiros, e deixar as agendas menos palatáveis para depois.
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Neste âmbito de “possível”, as fontes elencam a possibilidade de um maior contingenciamento (bloqueio temporário) de despesas no próximo relatório bimestral de receitas e despesas, previsto para julho. O objetivo seria sinalizar o compromisso com o núcleo da meta fiscal para 2024, que prevê défice zero.
Também estariam nesta lista a publicação do decreto de meta contínua de inflação no mês de junho, conforme prometido por Haddad, e medidas de revisão e aprimoramento de políticas públicas que não envolvam desvinculação de benefícios atualmente vinculados ao salário mínimo ou mudanças nos pisos de escolaridade . e saúde.
Entre as medidas que foram analisadas pela equipa económica, a
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vincular o reajuste do salário mínimo a benefícios como BPC, abono salarial e seguro-desemprego; a revisão das isenções de contribuições para a segurança social; os desequilíbrios no Regime Previdenciário (RPPS), destinado aos servidores públicos, e especialmente nas pensões militares. Outro ponto considerado foi a inclusão das despesas com o Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb) no cálculo para cumprimento do mínimo constitucional da Educação. Além disso, a equipe econômica tem estudos sobre limitar o reajuste dos pisos mínimos de Saúde e Educação pela mesma regra do quadro fiscal − ou seja, a incidência de um reajuste máximo de 2,5% reais (ou seja, descontada a inflação acumulada no último ano).
Nos últimos dias, Lula indicou que não estava disposto a realizar esse debate no momento – e a própria ministra Simone Tebet disse que essas medidas estariam no fim da lista de opções à disposição do governo federal. “Pensar que temos que piorar a saúde e a educação para melhorar, isso já é feito há 500 anos no Brasil. Há 500 anos o povo brasileiro não participava do Orçamento”, disse Lula em conversa com jornalistas.
“Essas propostas [de revisão de despesas] irritaram a ala ideológica do governo, que tem resistido à ideia de qualquer mudança nos benefícios previdenciários. Portanto, além de ter que negociar com o Congresso e o mercado, a equipe econômica tem que lidar com críticas internas à política fiscal”, apontam analistas da consultoria Arko Advice em relatório.
Do lado da previdência militar, o próprio Tribunal de Contas da União (TCU) comentou recentemente o assunto em relatório. No documento, o órgão destacou que o sistema arrecadou R$ 9,1 bilhões no ano passado, mas as despesas totalizaram R$ 58,8 bilhões, resultando em um déficit de R$ 49,7 bilhões. Mas um avanço na categoria poderia gerar um novo choque nas relações entre as Três Forças e o atual governo – um armistício difícil de ser construído por Lula.
“Em meio a essas discussões, ficam evidentes os desafios enfrentados pelo governo no equilíbrio das contas públicas, na satisfação das demandas dos diversos setores e na promoção do desenvolvimento econômico sustentável, conforme proposto pela equipe econômica”, concluíram os analistas da Arko Advice.
(com Agência Estado)
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