O dermatologista Carlos José Cardoso publicou um vídeo em suas redes sociais comentando o ocorrido com o médico Leandro Medice Passos Costa, 41 anos, falecido na última segunda-feira (13) em um abrigo na cidade de São Leopoldo (RS), região metropolitana região de Porto Alegre. Cardoso acompanhava Leandro na viagem ao sul do país.
Segundo Cardoso, horas antes de ser encontrado morto, Leandro parecia estar bem. A dupla saiu do Espírito Santo na madrugada deste domingo (12) para trabalhar, de forma voluntária, no atendimento às vítimas das chuvas no Rio Grande do Sul. No dia seguinte, Leandro foi encontrado morto.
Ao longo do domingo, afirmou Cardoso, ambos responderam normalmente. No final do dia, regressaram ao abrigo onde dormiriam e conversaram até perto da meia-noite.
“Combinamos que eu ficaria de plantão à noite, porque ele estava um pouco mais cansado, mas estava bem. Ele estava feliz, não estava sentindo nada. Conversamos muito antes de ele dormir. Até brinquei com ele que iria dormir no outro quarto, porque ele ronca”, contou a dermatologista. Leia o relatório completo abaixo.
Segundo a reportagem publicada no vídeo, Cardoso deu uma olhada no local por volta das 4h e percebeu que Leandro estava respirando. “Fui ao lado dele e ele estava roncando um pouco”, disse ele.
Pouco depois, entre 5h e 6h, o dermatologista voltou a ligar para o colega. “Ele estava em uma posição que parecia um pouco desconfortável. O ambiente ainda não estava tão claro. O dia ainda não havia amanhecido e eu não queria acordá-lo naquele momento.”
Cardoso afirmou que, depois de cerca de meia hora, voltou ao local onde Leandro dormia. “Como ele não atendeu meu chamado, fui apalpá-lo e ele já estava com frio. E então descobri que ele havia morrido. Foi um grande susto, porque, apesar de sermos médicos, eu não estava preparado psicologicamente”.
Causa da morte
A clínica onde Leandro trabalhava fez uma postagem em uma rede social informando que o médico sofreu um mal súbito. Segundo Cardoso, porém, ainda não se sabe o que causou essa situação.
“Não sabemos o que é [que provocou a morte]. A imprensa dizia que foi um ataque cardíaco. Não sabemos o que é. Ele não tinha sinais de quem teve um ataque cardíaco. Até porque ele era cardiologista e, se tivesse sentido alguma dor, qualquer coisa, ele teria me ligado. Eu estava acordado, ele sabia que eu estava ao lado dele”, destacou.
“Ele morreu abruptamente, uma morte imediata que não sabemos o que é. Podem ser várias possibilidades: um acidente vascular cerebral, uma embolia, uma série de problemas que até agora não sabemos o que são”, acrescentou Cardoso.
“Ele morreu como um herói”
Apesar da tristeza pela morte, a dermatologista afirmou que, por outro lado, a situação traz alívio. “Foi a morte como herói, cumprindo a palavra de Deus. Isso faz muita diferença e conforto para nossas vidas”, comentou.
“Traz, ao mesmo tempo, felicidade que ele tenha morrido fazendo o que queria: ajudar o próximo, que era a mensagem de Cristo, que é levar pão a quem tem fome, levar conforto a quem se sente incomodado. E isso ele estava fazendo”, acrescentou.
Acordar e enterrar
O velório de Leandro está marcado para começar nesta terça-feira (14), às 21h, no cemitério Jardim da Paz, na Serra, no Espírito Santo. O funeral está marcado para amanhã, às 10 horas.
Leia o relatório completo do colega:
“Olá pessoal. Sou Carlos José Cardoso, médico que acompanhava o Dr. Leandro, falecido durante nosso trabalho de ajuda humanitária no Rio Grande do Sul.
Vou fazer um relato porque em cada situação todo mundo fala alguma coisa. E eu era na verdade o mais próximo, certo? Vou dar um relatório para que cada meio de comunicação não fale coisas diferentes.
Trabalhamos aqui no sábado, comigo fazendo transplante capilar até 1h, e ele fazendo transplante capilar na outra clínica dele, também até 23h ou meia-noite.
Fomos juntos para o aeroporto. Fomos em um avião particular, que partiu às 4 da manhã. Mas ele estava muito bem, muito feliz por estarmos fazendo isso. Mais um médico gaúcho que se juntou ao grupo. Chegamos lá e fomos direto para o trabalho no domingo.
Atendemos o dia todo. Estávamos num abrigo com 1.600 pessoas, 500 crianças e cerca de 200 cães. Havia até um cachorro no abrigo. Tinha muita gente: enfermaria de idosos, enfermaria infantil, enfermaria de jovens. E havia apenas dois médicos recém-formados. Como a gente é mais velho, tem mais experiência, fez muita diferença, porque a gente conseguiu dar soluções, tanto ele quanto o cardiologista e o clínico, e prestamos muitos cuidados durante a noite.
Fomos para outro abrigo para atender mais pessoas, porque, no fim de semana, os médicos voluntários também ficavam com suas famílias. Era o Dia das Mães no domingo. E [depois dos atendimentos] voltamos [ao abrigo] e até ficamos conversando até por volta da meia-noite. Combinamos que eu ficaria de plantão à noite, porque ele estava um pouco mais cansado, mas ele estava bem, estava feliz, não estava sentindo nada. Conversamos muito antes de ele dormir. Até brinquei com ele que iria dormir no outro quarto porque ele ronca.
E então, às 4 da manhã, acordei para verificar e percebi que ele estava respirando. Fui ao lado dele e ele estava roncando um pouco. E às 5 ou 6 horas eu levantei para poder acordá-lo, para começarmos a nos preparar para o culto. Cheguei na sala, liguei para ele – não liguei muito alto, não. Ele estava em uma posição que parecia um pouco desconfortável. O ambiente ainda não estava tão claro. O dia ainda não havia amanhecido e eu não queria acordá-lo naquele momento.
Voltei 30 minutos depois. E aí, como ele não atendeu meu chamado, fui apalpá-lo e ele já estava com frio. E então descobri que ele havia morrido. Foi um susto enorme, porque, apesar de sermos médicos, eu não estava preparado psicologicamente. Então descobri sua morte.
Não sabemos o que é [que provocou a morte]. A imprensa dizia que foi um ataque cardíaco. Não sabemos o que é. Ele não tinha sinais de quem teve um ataque cardíaco. Até porque ele era cardiologista e, se tivesse sentido alguma dor, qualquer coisa, ele teria me ligado. Eu estava acordado, ele sabia que eu estava ao lado.
Ele morreu abruptamente, uma morte imediata que não sabemos o que é. Podem ser várias possibilidades: um acidente vascular cerebral, uma embolia, uma série de problemas que até agora não sabemos o que são.
O corpo dele está no IML. Deve chegar hoje, durante o dia ou no final da tarde. Ontem passamos o dia inteiro tentando trazer o corpo dele de volta, porque ele não é fácil. Não há aeronaves, nem lugar para pousar. Há poucos assentos disponíveis e você não pode entrar em nenhum avião. Ele tem que vir em um avião que possa trazer sua urna.
Então é isso. Traz, ao mesmo tempo, a felicidade de ter morrido fazendo o que queria: ajudar os outros, que era a mensagem de Cristo, que é levar pão a quem tem fome, levar conforto a quem se sente incomodado. E isso ele estava fazendo. Foi a morte como herói, cumprindo a palavra de Deus. Isso faz muita diferença e conforto para nossas vidas.”
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