O presidente russo, Vladimir Putin, causou surpresa nesta quinta-feira (5) ao manifestar seu apoio à candidatura presidencial da vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, elogiando o candidato democrata com alguns comentários curiosos.
“Nosso ‘favorito’, se é que podemos chamar assim, era o atual presidente, Sr. [Joe] Biden. Mas ele foi retirado da disputa e recomendou a todos os seus apoiadores que apoiassem a Sra. Harris. Bem, vamos fazê-lo – vamos apoiá-lo”, disse Putin no Fórum Económico Oriental, em Vladivostok. “Ela ri de forma tão expressiva e contagiante que isso significa que ela está bem.”
Putin também criticou o ex-presidente e atual candidato republicano Donald Trump por impor “tantas restrições e sanções contra a Rússia que nenhum outro presidente jamais havia introduzido antes dele”.
Os comentários de Putin surgem na sequência de sanções abrangentes anunciadas pela administração Biden para combater um esforço de desinformação apoiado pelo governo russo que visa influenciar as eleições de 2024 e impulsionar a candidatura de Trump.
E apesar do apoio vocal do líder russo aos democratas, a vice-procuradora-geral dos EUA, Lisa Monaco, disse na quarta-feira que três empresas russas – sob a direção de Putin – usaram perfis falsos para promover narrativas falsas. nas redes sociais.
Documentos internos produzidos por uma dessas empresas russas mostram que um dos objetivos do esforço de propaganda era apoiar a candidatura de Trump ou de quem quer que tenha surgido como candidato presidencial republicano, de acordo com um depoimento do FBI.
Então, o que Putin está tentando alcançar?
Se o passado servir de guia, Putin está simplesmente a abalar o cenário político interno dos EUA. Em dezembro de 2015, Putin elogiou Trump, chamando-o de favorito meses antes de o empresário garantir a indicação republicana.
“Ele é uma pessoa brilhante e talentosa, sem dúvida”, disse Putin, chamando Trump de “uma personalidade excepcional e talentosa”.
Será que Putin sabia alguma coisa sobre as eleições presidenciais dos EUA em 2016 que os investigadores não sabiam? Não, mas o líder do Kremlin pouco fez para esconder a sua aversão por Hillary Clinton, então a presumível candidata democrata.
E quando e-mails pirateados do Comité Nacional Democrata (DNC) foram divulgados pouco antes da Convenção Nacional Democrata, Putin não escondeu a sua satisfação.
Embora as autoridades americanas apontassem firmemente a Rússia como responsável pelo hack, Putin negou que o Estado russo tivesse qualquer envolvimento. E em declarações no mesmo fórum, em setembro de 2016, elogiou o vazamento como uma espécie de serviço aos eleitores, dizendo: “O importante é o conteúdo que foi dado ao público”.
Esse conteúdo foi a revelação embaraçosa nos e-mails vazados de que as autoridades democratas deram tratamento preferencial a Clinton.
Por outras palavras, todo o episódio do hack do DNC apoiou a visão do Kremlin de que a democracia americana é uma farsa: nada importa a não ser o poder, tudo é decidido em salas cheias de fumo, e criticar países como a Rússia pela adesão à democracia e aos direitos humanos é hipócrita.
A visão de Putin sobre o sistema político americano faz ainda mais sentido quando nos lembramos da visão do jornalista político russo exilado Mikhail Zygar, autor de “All the Kremlin Men”.
Zygar observou que Putin adorava “House of Cards” – a cínica série televisiva sobre a política de Washington – e até a recomendou aos seus ministros.
“Esse é o seu livro sobre política americana”, disse Zygar em entrevista.
Também é possível que Putin estivesse simplesmente provocando Harris ao aludir ao insulto constante de Trump sobre a maneira como ela ri.
Portanto, se a visão de Putin sobre a política eleitoral dos EUA for vista através das lentes de “House of Cards”, o apoio de Putin a Kamala Harris seria uma espécie de movimento ao estilo de Frank Underwood: uma espécie de endosso venenoso para o destinatário.
*Com informações de Anna Chernova e Christian Edwards.
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